terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

A Tempestade


 Levanto-me faço tudo como sempre, a rotina dos que pensam. Vou para janela, sento sem medo de cair, até que se eu caísse o máximo que poderia acontecer é a minha morte, que não seria uma coisa tão ruim assim, se eu morresse tiraria todas as duvidas que me aflige todos os dias, seria mais uma libertação do que algo triste. Não tenho medo de morrer, trato ela apenas como o fim de um filme ruim.

 Ao sentar já posso sentir o vento das 6 da tarde purificando-me. Vejo as pessoas apressadas para sair do trânsito interminável, as mulheres da feira arrumando tudo com tanta pressa que até parece que está chegando um temporal - que não seria algo tão ruim, vejo o sol se despedindo apesar de saber que todos estão muito ocupados para prestar atenção na sua luz se apagando.

 Escolho um vinil às cegas, dessa vez escolho algo para combinar com o meu triste. Digo isso sabendo que o triste está em todo lugar, está no fim do dia quando as moças da feirinha juntam seu dinheiro e veem que não ganharam o quanto que queriam. Está nas crianças que saem com uma bola em baixo do braço procurando um lugar para fazer uma festa de sorrisos, e não acham nenhum pequeno mundinho longe dos enormes prédios e da multidão de carro. Está em quem ama, em quem sorri, em quem chora, está nos poetas, nos músicos, nos engenheiros, nos médicos, nos ouvintes, nos professores, no sol que já foi embora... A tristeza está na vida.

 Parece até que é um sinal – ou destino. Logo que começa a tocar o LP as primeiras gotas caem do céu, e logo as nuvens cinza gritam, fazendo as pessoas presas no maior congestionamento que já vi, quererem fugir dali, como se fosse o fim do mundo, elas não entendem que é só mais uma tempestade de rotina. 

 Observo a reação das pessoas com a tempestade que aumenta cada vez mais. As crianças querem ficar e tomar banho de chuva, já as suas mães puxam elas para dentro achando que a tempestade irá engoli-las. Os carros parecem flutuar e se apagar no céu escuro. Já eu não ouço, não vejo, não rezo, não ajo, não respiro e nem suspiro, eu sinto a tempestade, sinto seus terrores, sua escuridão, sua cor, seu suor, seu toque.

  A tempestade é como o amor.

Nicole Elis.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Fala de uma velha alma.

 Estou ficando velha. Minha doença aposta corrida com minha caretice. Parece que quanto mais os dias passam mais um ano eu envelheço, e minha vertigem fica mais constante. Meu navio encalhou e agora o mundo gira em seu redor, mas ele é só um pequeno ponto no meio da imensidão azul.

 O tempo é um crime contra minha pessoa. Deveria poder modifica-lo como se modifica a argila. O problema é que não há caverna que escape do tempo.

 Parece que a velhice me faz sonhar menos, não tenho tempo para fechar os olhos e pensar, a vela acesa não me deixa dormir e nem tentar sonhar. Agora respeito a lei da gravidade, estou com pés no chão, apesar de querer voltar a voar com as nuvens de algodão.

 Me sinto velha pelas rugas criadas em meu coração, que me faz só pensar em como está velho, e o quanto preciso troca-lo. Talvez não seja eu, talvez seja ele que esteja envelhecendo com tanta rapidez, assim como as paredes descascadas das medianeiras.

 Pode ser que seja apenas uma troca de pele, e que logo toda essa velhice precoce saia, e uma nova criança se habitue em mim. Mas é provável que a juventude seja apenas uma máscara perdida no caminho, que pode ser encontrada outra mais para frente, ou não.

 É possível que a velhice viva até um outro amor.


Nicole Elis

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Vazio de verão.

 A lacuna que o verão está deixando é maior que o sol que esquentou minha cabeça por tanto tempo. Queimo por fora e por dentro, de sentimentos incógnitos. Sim, o sentimento está por fora, consigo ver o reflexo deles no espelho, eles gritam para ser ouvidos por todos, mas só eu consigo ficar surda com seus gritos. Acho que é porque sinto...

 Apesar do vácuo gritante dentro de mim, me sinto cheia de tudo, até o impossível está dentro de mim. É o tudo disfarçado de nada. Parece que de tão quente que isso é, não consigo mais me mexer levemente para dançar no ritmo da vida, e vou ficando cada vez mais parada, no canto, como se estivesse triste, mas é só o tudo, ou o nada, é só o sol.

 E as nuvens se mexem, só elas. O sol fica parado, esperando ser coberto. E quando a chuva cai é como uma comemoração sem querer saber das grandes consequências, é como um carnaval dentro de mim. Então sentimentos gritantes passam à cantar rimas tão bobas que é até difícil de entender o que se passa. Mais uma vez são confusos e inexplicáveis.

 Os sonhos vão se aprofundando ainda mais em cada pedaço de mim, e vai ocupando todo o meu ser, tentando acabar com todos os espaços vazios. Então tudo vira sonho, sono, ilusão. Os sentimentos que antes gritavam e depois cantavam, evaporaram depois da grande chuva.

 Viro por mais uma vez uma alma de sonhos, uma pobre cabeça iludida, enquanto em algum lugar de mim ainda sobram grandes vazios, que talvez não seja tão vazio assim...

Nicole Elis

Restos de uma semana vazia.

O confuso me arrasta a cada dia mais, pelo chão áspero da rua vazia. E parece que em cada volta do mundo os sonhos vão desaparecendo aos poucos. É triste e sem cor, é noite. Os sonhos se perdem, o sorriso se destrói, e o pequeno mundo que guarda o "eu" que só eu sei que ainda vive, se abre, explode, morre.

 O coração faz de suas batidas uma musica lenta e melancólica. O triste que era descrito antigamente, mudou. Era mais denso. E o confuso transformava o "amor" em algo tão ruim, que ao ouvir a palavra seu coração já podia ser ouvido com sua musica lenta. Parece que sentar e esperar as rugas aparecerem, e o conhecimento de cada lugar que pode ser pisado aumentar. Mas erros vem de passos errados e de noites mal dormidas. Vem de insônias pensando e decidindo quem eu serei na manhã seguinte. Vem de mim. Dos momentos juntos com quebra-cabeça. Do impacto dos erros com o certo. Vem dos pés ao vento, fugindo do chão.

 O que me incomoda é que eu sei o que os erros fazem, mas e o amor? Talvez ele faça errar, e errar é aprender... Mas é estranho ter esse ciclo em sua vida quase todos os dias em que acorda com o coração pela boca. Acho que isso anda de mão dadas com o confuso, e assim torna-me uma alma arrastada pelo chão áspero da rua escura e vazia.

Nicole Elis


terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Outono

 Está cada vez mais difícil pronunciar um não para meus desejos. O eu quer, o eu obriga, o eu consegue. E é assim que o novo invade cada vez mais meu ser, o novo amor, o novo desejo de se libertar. Os meus suspiros não são pelo mesmo motivo, e minha criatividade muda para pior a cada dia mais. Não consigo mais jogar tudo para fora como jogava antes, falo mais que escrevo, e isso que antes parecia bom, estraga o pequeno mundo de "eu".

 Minha alma mendiga não solta mais palavras, muito menos lágrimas. Tudo percorre pelo meu sangue, como em uma corrida sem fim, que vai de um lado para o outro, procurando um lugar para pular, mas tudo parece tão cansado que prefere ficar lá. E aperta, e dói. É congestionamento em uma alma mendiga, de palavras, de eu, de mim, de tudo.

 Parece que todos os meus conhecimentos viraram pó. Sou como uma nova criança boba, sem saber da vida, apenas dançando junto dela.

 As pontas dos meus dedos já cansaram de bater em ordem na pequena mesa, fazendo o ritmo do silêncio, e o olhar do que não é visto. Uma saudade enorme grita alto demais, dói meus ouvidos, mas saudades de quê? Talvez seja dos antigos olhos que poderiam ser chamados de céu. Provável que seja dos pés ritmados, dos braços ao vento, do sorriso inexplicável. Ou é, a simples saudades do "eu".

 Não consegui me largar, nem me jogar, nem deixar tudo de lado. Só continuo sendo algo desarrumado em uma estante qualquer, que muda constantemente. Sou o "eu" de sempre, com saudades de um "eu" que talvez não existiu.

 Pode ser que tudo seja levado com o velho e bom vento de outono. O novo, o velho, o tudo, o nada. E que sobre apenas eu.